A
primavera está chegando aqui! Lindos dias ensolarados que lembram a minha
infância. Hoje pela manhã enquanto caminhava para a universidade, lembrei de outro
dia de sol, perdido em minha memória, quando formigas apressadas levavam
pedaços de folhas para a sua casa. Eram de um pequeno formigueiro escondido,
próximo a um canteiro em nossa antiga casa de madeira. Se nos primeiros dias pouco me importei com o árduo trabalho das pequenas, detendo-me apenas uns
poucos minutos a observar, houve uma tarde que fiquei ali parada por uma hora
ou mais. As formigas carregavam para o interior do formigueiro os pedaços de um
inseto morto, e me permitiram pensar os mistérios da vida e da morte, da carne
e do pó, e a providencial renovação do mundo.
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Foto: reprodução |
No
dia seguinte voltei ao formigueiro, ingenuamente tentando dar nomes às
formigas, tentando reconhecer pequenas diferenças individuais em meio aquela
multidão. Nos livros da biblioteca da escola, pesquisei sobre o interior do
formigueiro, curiosa para saber para quê levaram os pedaços do inseto e o que
fariam com ele. Aprendi muito em dois dias e voltei a observá-las no terceiro,
dessa vez questionada pelo meu avô paterno, que resolveu implicar com o tempo
que eu estava ‘perdendo’ com as formigas, que já pensava como de estimação.
No
quarto dia voltei bem empolgada da escola, pois havia encontrado um livro
maravilhoso com fotos do interior de um formigueiro, e não apenas ilustrações,
também com imagens de diversas espécies de formigas. Pensei que agora poderia
descobrir o ‘tipo’ de formigas que eram minhas amigas. De longe, vi meu avô
paterno parado diante do formigueiro, achei que ele pudesse ter se interessado
pela vida delas. Mas não, ao chegar perto vi que em sua mão havia uma chaleira
com água fervendo que ele jogava sobre o formigueiro. E disse-me que estava
matando-as para que nenhuma criança pisasse no formigueiro e fosse picada pelas
formigas. Eu era a única criança a brincar naquele canto do quintal e lembro
que pensei em questionar, mesmo com medo, mas ao olhar pra ele, vi-o sorrindo e
soube que era inútil. Aquele sorriso me ensinou muito sobre outros mistérios da vida e da morte, da carne e do pó e da banalidade da crueldade humana.
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Foto: reprodução |
Besançon, 12/03/2014