‘Apague os seus rastros!’ –
Bertolt Brecht
Noite passada tive um sonho, em imagens vívidas, daquele que
sabemos que têm algo a nos dizer. Sonhei que tinha uma grande quantidade de
lixo para jogar fora, todo o tipo de sucata: vidros, metais, papéis, móveis
velhos, etc., empilhados em grandes prateleiras no quintal da casa onde cresci,
nossa velha casa de madeira. Vendi os entulhos mais supérfluos, mais leves, no
qual pensei serem ‘sem valor’. Contente, os vi sendo processados e transformados
em grandes blocos prensados para serem encaminhados as empresas de reciclagem.
Mas as grandes prateleiras ainda estavam lá com o lixo mais
pesado e que para mim era mais valioso, por isso queria vender para outra
pessoa e não para o chiffonier que vendi
o pequeno lixo. Um estranho sucateiro, vestido elegantemente de terno e com
relógio de bolso, um novo-rico com ares de trapaceiro, alguém que enriqueceu com
o lixo dos outros. Senti enorme antipatia por ele, pois ‘tirava’
algo precioso de mim.
Sabia que o destino do lixo seria o mesmo, mas resistia em
vendê-lo, com apego aquele lixo, acreditando que poderia ganhar mais se
vendesse a outro chiffonier. Repentinamente,
meu pai e meu irmão chegam e começam a negociar o lixo com o mesmo sucateiro,
não foi exatamente uma negociação, apenas disseram que queriam se livrar de
tudo aquilo e começaram a carregar para o caminhão parado na frente de casa. Enquanto
eles passavam com caixas e móveis, eu olhava paralisada.
Meu irmão lembrou das velhas garrafas de cerveja que também
podiam ser vendidas, estas estavam em outras prateleiras fixas na parede
lateral da casa; elas não eram minhas, mas de meu pai. Estranhamente não estavam
em engradados, mas em grandes barris azuis de plástico. O sucateiro as recusa,
diz que não tem interesse. Fico indignada por ele recusá-las, não compreendo,
pois é vidro e este é 100% reciclável, por que recusá-las? Quem era afinal esse
chiffonier?
De repente, sinto um grande apego ao meu lixo, e percebo que
não quero me livrar de nada, quero guardar tudo, mantê-lo nas prateleiras atrás
de nossa velha casa. Porém, meu pai e meu irmão continuam a levar tudo para o
caminhão, contam também com ajuda de empregados do malicioso chiffonier. Sinto-me desolada, ainda
apegada a todo o lixo que via passar na minha frente.
***
Ao acordar, sabia que precisava me desapegar de todo aquele
lixo, que precisava apagar aqueles rastros e ruínas de minha memória afetiva.
10/12/2013
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